Dia 19 – Indígenas, mães e universitárias: a violência do racismo institucional e seus múltiplos atravessamentos – 8 de Dezembro
A presença de indígenas mães na universidade representa um marco importante na luta por inclusão e igualdade de oportunidades para os povos originários. Estas mulheres ao acessarem espaços da academia enfrentam desafios específicos, pois deparam-se com uma realidade completamente diferente da sua cultura, tradição, cosmologia e espiritualidade.
Entre os desafios, destacamos:
1. Cultural: A experiência universitária pode ser muito diferente da vivenciada em suas comunidades. A Universidade abre suas portas para o diverso, o plural, porém do lado de dentro às indígenas mães sentem a pressão para se adaptarem a uma cultura que quase nunca reconhece ou valoriza suas tradições. Quando na verdade o que deveria se ter é uma complementaridade de conhecimentos e não essa adaptação, que impõe um conhecimento, uma cultura sobre as outras.
2. Financeiro: Muitas vezes, as indígenas mães enfrentam dificuldades financeiras, que podem ser agravadas pela necessidade de cuidar dos filhos enquanto estudam. O acesso a bolsas de estudo e auxílios é fundamental.
3. Apoio institucional: A falta de estruturas que acolham suas necessidades específicas como serviços de apoio psicológico e auxílios que garantam moradia estudantil específica que acolha essas mães com seus/suas filhos/as. E para além disso, um plano de permanência efetivo que permeie todos os espaços da Universidade, sensibilizando a comunidade acadêmica para esses novos sujeitos e valorizando, dando visibilidade às suas epistemologias, conhecimentos, tradições etc.
Sabemos o quanto estes desafios são fruto de uma sociedade racista, machista, misógina. Então, se ser mulher nesse contexto já é por si só um desafio, ser mulher, mãe e indígena interseccionalizando aqui questões de gênero e étnico-raciais, é uma munição para dificultar sua permanência num meio masculino, branco e eurocêntrico como o universitário.
Ainda mais na cultura indígena onde a figura materna é fundamental para o equilíbrio, a estabilidade de toda uma aldeia, o afastamento dessa mãe para poder estudar dificulta essa engrenagem, pois, entre outras coisas, sobrecarrega quem fica. Também o contato com os costumes, culturas, saberes que diferem completamente dos seus e dos/as filhos/as que carrega com ela pra dentro do espaço acadêmico, propicia o distanciamento destes/as da sua ancestralidade ameríndia, ainda mais quando chegam ainda bebês naquele espaço.
Por isso é fundamental pensar em políticas que fomentem iniciativas como:
– Programas de inclusão: implementação de programas voltados para a inclusão de indígenas, oferecendo cursos de formação específica, estágios, orientação pedagógica e monitorias.
– Redes de apoio: Grupos de apoio que conectem estudantes indígenas mães podem ser fundamentais para compartilhar experiências e estratégias de enfrentamento.
– Curricularização da história afro-brasileira e indígena: construir projetos políticos-pedagógicos que assegurem disciplinas obrigatórias nessas áreas valorizando e visibilizando os sujeitos daqueles grupos étnico-raciais.
Reconhecendo que as mães indígenas são atravessadas no seu cotidiano por inúmeras violências pelo simples fato de existirem, é preciso construir um ambiente seguro, verdadeiramente acolhedor e inclusivo dentro de um viés que também enxergue essas mães como figuras essenciais naquele espaço e que as políticas de ação afirmativa e permanência possam efetivamente contribuir com:
1. Empoderamento: A formação acadêmica proporciona às indígenas mães não apenas conhecimento, mas também empoderamento para reivindicar seus direitos e o de suas comunidades.
2. A troca dialógica de conhecimentos: Elas têm um papel crucial na circularidade e troca de saberes e tradições culturais, contribuindo para a diversidade dentro do ambiente universitário.
3. Relações intergeracionais: A presença delas nas universidades pode inspirar outras mulheres em suas comunidades a buscarem a educação, criando um ciclo de crescimento e apoio mútuo.
4. Conclusão da graduação: que retornem para seus territórios graduadas e possam trabalhar junto a seus/suas parentes em frentes que são necessárias para a preservação de seus povos.
A luta por um ambiente acadêmico mais inclusivo e acolhedor está longe de acabar, ela é contínua dentro de um processo que não é linear, ele tem avanços e vários momentos de retrocessos, por isso a valorização da participação das minorias políticas, em especial aqui das indígenas mães é um passo essencial nessa jornada.
Por Por Janaina Guerra – Assistente Social/UFPel e Doutoranda em Política Social e Direitos Humanos/UCPel.